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Política

Os cúmplices mais ordinários do sistema

Por Luís Ernesto Lacombe

Por | Publicado em: 31/08/2025 12:13:48 | Fonte: Gazeta do Povo

Os cúmplices mais ordinários do sistema
Fachada do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília (Foto: Gustavo Moreno/SCO/STF)

Está estabelecido. É crítico de Lula e sua turma, é crítico de Alexandre de Moraes e sua turma? Será perseguido e condenado. Não importa se não há provas de qualquer tipo de crime, não importa. É um jogo de cartas marcadas em que não há nem a preocupação de disfarçar a falcatrua. Não é um desafio entre dois lados baseado em regras claras e respeitadas. O adversário joga, tendo o juiz como estrela do time. As leis só valem ou não valem para prejudicar opositores de quem está no poder e beneficiar quem manda e seus cúmplices. Já faz algum tempo que é assim.

Aqueles que exigem o cumprimento das leis, de todas elas, foram abandonados. E a imprensa entrou para o time dos vilões. Essa turma que abandonou o jornalismo não quer saber se o que apontava como abusos da Lava Jato não é nada perto do que tem sido feito contra apoiadores de Jair Bolsonaro. De novo, o que não vale para um lado vale para o outro, e vice-versa, conforme interesses abjetos. A semana que passou teve novos exemplos disso, mas a imprensa que desistiu de ser imprensa fingiu que não viu, que nada aconteceu.

São muitos abusos, arbítrios e muitas ilegalidades, mas a imprensa que desistiu de ser imprensa mantém o silêncio

Quem trata o 8 de Janeiro como uma “tentativa de golpe de Estado” não acha que as manifestações ainda mais violentas promovidas por companheiros do Lula – em 2006, 2013, 2014 e 2017 – também podem ganhar essa classificação. Eram só manifestantes aqueles que, nessas ocasiões, atacaram as sedes dos três poderes, que tentaram incendiar prédios de ministérios. Não foram chamados de golpistas, de radicais, de terroristas... Suas bandeiras eram vermelhas e justificavam qualquer tipo de excesso.

E só a imprensa verdadeiramente independente noticiou os abusos, arbítrios e as ilegalidades cometidos por Alexandre de Moraes contra pessoas presas nos dias 8 e 9 de janeiro de 2023. Com base em trocas de mensagens reveladas no começo de agosto em mais uma série de reportagens, ficou provado que Moraes fez de tudo para manter os detidos na cadeia. Os arquivos mostram que as prisões foram motivadas por questões políticas.

Nenhuma pessoa foi liberada, antes que fosse feita uma varredura em suas redes sociais. O “discurso” on-line considerado “criminoso” era às vezes apenas uma postagem sobre a importância de se cumprir a Constituição. A então chefe de gabinete de Moraes chegou a pedir liberdade provisória para muita gente, mas o magistrado não queria soltar ninguém sem antes “ver na rede se tinha alguma coisa”, desrespeitando a Lei Geral de Proteção de Dados e até o prazo de 24 horas para a realização da audiência de custódia.

Agora, novas mensagens trocadas por WhatsApp pelas equipes de Moraes no STF e no TSE, de outubro de 2022, mostram como foi tramado o banimento da rede social GETTR do território brasileiro. O bloqueio, ilegal, foi conseguido. Os jornais que já foram importantes um dia e os portais de notícias mais acessados não deram uma linha sequer sobre o caso. Também não falaram nada sobre outra trama da turma de Moraes, para perseguir a deputada federal Carla Zambelli.

A hostilidade contra a parlamentar fica clara igualmente em mensagens por WhatsApp trocadas pelos assessores de Moraes, de novo em outubro de 2022, e só divulgadas agora pela mídia independente. Até vídeo de homenagem da Zambelli à mãe dela foi considerado “ofensivo”... Por que os jornalistas que abandonaram os princípios fundamentais de sua profissão não viram nada de estranho nessa mensagem de Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes: “Esse post é bom de ferrar com essa mulher”? O ministro acabou bloqueando as contas da parlamentar.

São muitos abusos, arbítrios e muitas ilegalidades, mas a imprensa que desistiu de ser imprensa mantém o silêncio. Finge que desconhece que o STF não pode dar ordens ao TSE. O que a Justiça Eleitoral fez – no caso do GETTR, da Zambelli e de tantos outros –, cumprindo ordens de um ministro do Supremo, e ainda para promover censura, extrapola competências constitucionais e configura desvio de finalidade. Não é jornalista quem não entende que a lei prevê remoção pontual de conteúdos, mas não o bloqueio de um perfil, de uma rede social inteira. Isso é uma atitude desproporcional e abusiva, e configura censura prévia, proibida pela Constituição.

Os “jornalistas” não acham estranho que o veredito dos réus da fajuta “tentativa de golpe de Estado” seja divulgado assim, antecipadamente

As mensagens das equipes de Moraes provam que o STF assumiu funções de investigação e acusação, que pertencem à Polícia Federal e ao Ministério Público, que o devido processo legal foi eliminado. Um juiz não pode ser vítima, acusar, investigar e julgar ao mesmo tempo... Muito menos pode antecipar uma decisão. Nos casos que vieram à tona essa semana, o banimento do GETTR e o bloqueio das contas em redes sociais da Carla Zambelli. E não pode ser considerado jornalista alguém que é parcial e que, assim, defende a parcialidade de quem está no poder.

Que imprensa é essa que apenas publica informações conseguidas no gabinete de Alexandre de Moraes sobre o desejo dele de mandar Bolsonaro para a Papuda e nada questiona? O ministro quer criar no presídio uma “ala golpista”... E está tudo normal. Os “jornalistas” não acham estranho que o veredito dos réus da fajuta “tentativa de golpe de Estado” seja divulgado assim, antecipadamente. Os “jornalistas” não acham o fim do mundo viver num país em que “juízes” tenham a sentença pronta antes do julgamento. Eles normalizam os crimes cometidos por um certo grupo e inventam crimes para o outro lado... O caos que virá disso tudo não poupará ninguém, nem os cúmplices mais ordinários do sistema.

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